Até bem pouco tempo eu recebia mensalmente, em meu endereço residencial, o jornal oficial de certa denominação protestante. Folheando um desses exemplares, um artigo saltou-me aos olhos. Estava em uma seção tipo perguntas e respostas, à qual os leitores escrevem sobre suas dúvidas e o órgão oficial responde de acordo com o estatuto da denominação.
Naquela edição, um leitor tinha dúvidas sobre qual procedimento adotar no caso de um oficial (pastor) desligar-se daquela denominação e ligar-se a outra, retornando àquela igreja de origem, algum tempo depois. A questão era se tal pastor deveria ser recebido ou disciplinado!
O pastor responsável pela seção do jornal pontuou sua resposta à luz dos cânones da denominação. Sua resposta dizia algo assim: se tal oficial ligar-se a outra denominação histórica, ao retornar deve ser recebido com as credenciais que lhe foram dadas antes do desligamento. Mas – prosseguia, se ligar-se a uma igreja histórica de orientação pentecostal ou a uma igreja neopentecostal, o tal pastor deve ser recebido e colocado no banco e tratado como catecúmeno. Deverá ser disciplinado e reintegrado, podendo seguir sua carreira ministerial como qualquer outro membro, após a disciplina.
Quando li o nome do pastor que assinara essa orientação, fiquei impaciente. Aquele homem havia sido dirigente de uma igreja à qual eu havia sido convidado – e participado – de diversos programas. Preguei em um culto para toda a igreja; preguei no culto da família, para casais; preguei no culto dos jovens diversas vezes, tendo inclusive participado de alguns acampamentos como preletor oficial. Enfim, eu, um pastor de orientação doutrinária pentecostal, pude tantas vezes pregar e ensinar, àquele grupo de irmãos, sobre diversos assuntos; entretanto, se um deles viesse para uma igreja da minha orientação teológica, deveria ser considerado catecúmeno! O que estava havendo? Onde estava o furo em toda essa história?
Sem demora, escrevi um email ao pastor relatando que eu mesmo, um pastor de orientação pentecostal, havia pregado por diversas vezes na igreja da denominação dele, mais especificamente na igreja dirigida por ele, e que não entendia o preconceito claramente indicado na sua resposta. Que orientação, no mínimo contraditória, era aquela? Poucos dias depois, o pastor respondeu, retratando-se. Ele dizia, em linhas gerais, que, na qualidade de editor responsável por aquela específica coluna do órgão oficial da sua denominação, ele deveria dar orientação aos leitores de acordo com o estatuto oficial da igreja, embora ele mesmo não concordasse cem por cento com as diretrizes ali estabelecidas. Em outras palavras, no papel, milhares de fiéis são “dirigidos” por uma tradição suscitada por algum tipo de documento, mas, na prática, no dia-a-dia, “dá-se um jeito” (de viver pacificamente?) e rasgam-se os documentos.
O que um estatuto representa no contexto eclesial? Que força pode ser atribuída a um documento como esse? E o que dizer dos Credos e Confissões?
** Extraído do livro É cristã a Igreja Evangélica, publicado pela Arte Editorial
Via: http://neoprotestante.blogspot.com
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