Prefeitura realizou concurso para contratação de cem professores de religião, que vão lecionar a partir do segundo semestre nessas unidades
Os pequenos alunos do 1º ao 3º ano do ensino fundamental de 80 escolas da rede municipal podem nem saber, mas voltarão das férias de julho no centro de uma polêmica. A prefeitura já realizou concurso para a contratação de cem professores de religião, que vão lecionar a partir do segundo semestre nessas unidades. O modelo será confessional, ou seja, voltado para cada credo. A princípio, serão 45 docentes católicos, 35 evangélicos, dez espíritas e dez de religiões afro-brasileiras. Apenas os estudantes cujos pais deram autorização, durante a pré-matrícula, terão um tempo de aula por semana da disciplina. Para as outras crianças, haverá “educação para valores” (apresentação de temas ligados à ética e à cidadania) durante o período vago.
A iniciativa da Secretaria municipal de Educação é consequência de uma lei, proposta pelo próprio Executivo, aprovada em outubro do ano passado pela Câmara e sancionada logo em seguida pelo prefeito Eduardo Paes. O texto criou a categoria de professor de ensino religioso nos quadros da rede, abrindo a possibilidade de concurso para até 600 docentes. A regra estabelece que os profissionais contratados “devem ser credenciados pela autoridade religiosa competente, que exigirá formação obtida em instituição por ela mantida ou reconhecida”. É exigido ainda nível superior com licenciatura plena, sem especificação de disciplina.
Tema está em análise no Supremo
Assunto que sempre gera discussões, o ensino religioso chega à rede municipal do Rio ao mesmo tempo em que é discutido no Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília. Em 2010, a Procuradoria Geral da República entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a União e o Congresso, que ratificaram, através de decreto, o texto de um acordo firmado no governo Lula com a Santa Sé, dizendo que “o ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários das escolas públicas de ensino fundamental”.
Apesar de o mesmo texto do acordo ressaltar que “está assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição”, a procuradoria defende o ensino não confessional, de caráter ecumênico. A principal alegação é que o acordo com a Santa Sé fere a Carta Magna ao violar o princípio da laicidade do Estado. O processo ainda está em análise, tendo como relator o ministro Carlos Ayres Britto.
No Rio, o processo de aprovação da lei foi recheado de discussões. O texto original do Executivo acabou recebendo emendas. O presidente da Comissão de Educação da Câmara, Paulo Messina (PV), afirmou que, por ele, o projeto teria sido derrubado, mas destacou as mudanças obtidas:
— O projeto surgiu de um acordo do prefeito com a Igreja Católica. Ao menos garantimos o caráter plural do ensino, ou seja, se um pai disser que quer que seu filho tenha aula de uma determinada religião, ele tem o direito de exigir isso. Outro ponto importante foi a prioridade para escolas de tempo integral, para que não fossem retirados tempos de outras disciplinas para a introdução do ensino religioso.
Por meio de sua assessoria de imprensa, o prefeito informou que, para a elaboração do projeto de lei, “houve um entendimento entre diversas denominações, e a Igreja Católica foi uma das grandes parceiras da prefeitura”. A secretária de Educação, Claudia Costin, não quis se pronunciar sobre o assunto. Entre as unidades que terão a disciplina a partir do segundo semestre, estão as escolas municipais República do Peru, no Méier; Canadá, no Estácio; e Capistrano de Abreu, no Jardim Botânico.
Bispo auxiliar e referencial paraensino religioso da Arquidiocese do Rio, dom Nelson Francelino Ferreira defendeu o modelo que está sendo implementado no município:
— A educação tem que estar voltada para o desenvolvimento integral. E o elemento religioso é essencial para a estrutura da pessoa humana. Não pode estar de fora da escola. O Estado deve dar espaço para que esse elemento essencial esteja presente, conforme a crença dos pais dos alunos. O nosso Estado é laico, o que não significa que seja ateu.
Dom Nelson acrescentou que, para os professores católicos da rede municipal, foi pedida formação em teologia:
— Faremos um acompanhamento paralelo para que haja uma formação ecumênica dos profissionais. Estamos atentos para que o ensino religioso não seja usado como elemento de proselitismo. Não é catequese.
Já o coordenador do Observatório da Laicidade do Estado, da UFRJ, Luiz Antônio Cunha, é contra o ensino religioso confessional:
— Há uma espécie de desistência do Estado de assumir suas atividades pedagógicas ao transferi-las para instituições religiosas. Os professores das escolas públicas são pagos por todo o povo, através de impostos, inclusive daquelas pessoas que não têm religião.
Reverendo diz que apoia a iniciativa
Para o reverendo Daniel Rangel, da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, a medida da prefeitura vai ajudar a sociedade carioca a aceitar melhor a pluralidade de religiões:
— Acho positivo porque vai ensinar às crianças não apenas valores éticos ligados à sociedade civil, mas à religião. Vai ser uma oportunidade de a sociedade do Rio aprender a se relacionar com a pluralidade religiosa.
Pela primeira redação da Lei de Diretrizes e Bases, que criou em 1996 as normas atuais da educação, o ensino religioso não poderia trazer ônus aos cofres públicos. Ou seja, a contratação de professores, por exemplo, era vedada. Em 1997, esse artigo foi retirado. Ficou determinado que estados e municípios estabelecessem suas normas, “assegurado o respeito à diversidade cultural e religiosa”.
Fonte: O Globo
Os pequenos alunos do 1º ao 3º ano do ensino fundamental de 80 escolas da rede municipal podem nem saber, mas voltarão das férias de julho no centro de uma polêmica. A prefeitura já realizou concurso para a contratação de cem professores de religião, que vão lecionar a partir do segundo semestre nessas unidades. O modelo será confessional, ou seja, voltado para cada credo. A princípio, serão 45 docentes católicos, 35 evangélicos, dez espíritas e dez de religiões afro-brasileiras. Apenas os estudantes cujos pais deram autorização, durante a pré-matrícula, terão um tempo de aula por semana da disciplina. Para as outras crianças, haverá “educação para valores” (apresentação de temas ligados à ética e à cidadania) durante o período vago.
A iniciativa da Secretaria municipal de Educação é consequência de uma lei, proposta pelo próprio Executivo, aprovada em outubro do ano passado pela Câmara e sancionada logo em seguida pelo prefeito Eduardo Paes. O texto criou a categoria de professor de ensino religioso nos quadros da rede, abrindo a possibilidade de concurso para até 600 docentes. A regra estabelece que os profissionais contratados “devem ser credenciados pela autoridade religiosa competente, que exigirá formação obtida em instituição por ela mantida ou reconhecida”. É exigido ainda nível superior com licenciatura plena, sem especificação de disciplina.
Tema está em análise no Supremo
Assunto que sempre gera discussões, o ensino religioso chega à rede municipal do Rio ao mesmo tempo em que é discutido no Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília. Em 2010, a Procuradoria Geral da República entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a União e o Congresso, que ratificaram, através de decreto, o texto de um acordo firmado no governo Lula com a Santa Sé, dizendo que “o ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários das escolas públicas de ensino fundamental”.
Apesar de o mesmo texto do acordo ressaltar que “está assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição”, a procuradoria defende o ensino não confessional, de caráter ecumênico. A principal alegação é que o acordo com a Santa Sé fere a Carta Magna ao violar o princípio da laicidade do Estado. O processo ainda está em análise, tendo como relator o ministro Carlos Ayres Britto.
No Rio, o processo de aprovação da lei foi recheado de discussões. O texto original do Executivo acabou recebendo emendas. O presidente da Comissão de Educação da Câmara, Paulo Messina (PV), afirmou que, por ele, o projeto teria sido derrubado, mas destacou as mudanças obtidas:
— O projeto surgiu de um acordo do prefeito com a Igreja Católica. Ao menos garantimos o caráter plural do ensino, ou seja, se um pai disser que quer que seu filho tenha aula de uma determinada religião, ele tem o direito de exigir isso. Outro ponto importante foi a prioridade para escolas de tempo integral, para que não fossem retirados tempos de outras disciplinas para a introdução do ensino religioso.
Por meio de sua assessoria de imprensa, o prefeito informou que, para a elaboração do projeto de lei, “houve um entendimento entre diversas denominações, e a Igreja Católica foi uma das grandes parceiras da prefeitura”. A secretária de Educação, Claudia Costin, não quis se pronunciar sobre o assunto. Entre as unidades que terão a disciplina a partir do segundo semestre, estão as escolas municipais República do Peru, no Méier; Canadá, no Estácio; e Capistrano de Abreu, no Jardim Botânico.
Bispo auxiliar e referencial paraensino religioso da Arquidiocese do Rio, dom Nelson Francelino Ferreira defendeu o modelo que está sendo implementado no município:
— A educação tem que estar voltada para o desenvolvimento integral. E o elemento religioso é essencial para a estrutura da pessoa humana. Não pode estar de fora da escola. O Estado deve dar espaço para que esse elemento essencial esteja presente, conforme a crença dos pais dos alunos. O nosso Estado é laico, o que não significa que seja ateu.
Dom Nelson acrescentou que, para os professores católicos da rede municipal, foi pedida formação em teologia:
— Faremos um acompanhamento paralelo para que haja uma formação ecumênica dos profissionais. Estamos atentos para que o ensino religioso não seja usado como elemento de proselitismo. Não é catequese.
Já o coordenador do Observatório da Laicidade do Estado, da UFRJ, Luiz Antônio Cunha, é contra o ensino religioso confessional:
— Há uma espécie de desistência do Estado de assumir suas atividades pedagógicas ao transferi-las para instituições religiosas. Os professores das escolas públicas são pagos por todo o povo, através de impostos, inclusive daquelas pessoas que não têm religião.
Reverendo diz que apoia a iniciativa
Para o reverendo Daniel Rangel, da Igreja Episcopal Anglicana do Brasil, a medida da prefeitura vai ajudar a sociedade carioca a aceitar melhor a pluralidade de religiões:
— Acho positivo porque vai ensinar às crianças não apenas valores éticos ligados à sociedade civil, mas à religião. Vai ser uma oportunidade de a sociedade do Rio aprender a se relacionar com a pluralidade religiosa.
Pela primeira redação da Lei de Diretrizes e Bases, que criou em 1996 as normas atuais da educação, o ensino religioso não poderia trazer ônus aos cofres públicos. Ou seja, a contratação de professores, por exemplo, era vedada. Em 1997, esse artigo foi retirado. Ficou determinado que estados e municípios estabelecessem suas normas, “assegurado o respeito à diversidade cultural e religiosa”.
Fonte: O Globo
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